PRESIDENTE DUTRA,
ISTO, AQUILO O OUTRO
MINHAS ALVISTAS
Este era um costume da Dutra. O povo de lá gostava de ir para
São Paulo capital e passava muito tempo sem vir, pois se voltasse logo era um
fraco, um derrotado. Quando vinha a passeio suas casas se enchiam de parentes e
amigos, que tocados de saudades, não deixavam o “paulista” sozinho, nem para
tomar banho, queriam porque queriam saber notícias dos parentes que moravam na
capital bandeirantes, assim como, as notícias paulistanas que eram poucas, pois
nossos patrícios eram humildes, moravam nas periferias e não tinham acesso ao
luxo e nem ao poder paulista, os quais escutávamos apenas pelas Ondas Largas da
Rádio AM Bandeirantes e sonhávamos que aquilo tudo era acessível a quem fosse
até lá, o que era uma grande ilusão transformada em decepção quando os baianos
simplórios e atrasados desciam na Rodoviária do Glicério na capital Paulista,
uma rodoviarizinha de interior, onde nossos conterrâneos começam a sofrer o
preconceito paulistano, bichos nordestinos, tinham que desembarcar era num
chiqueiro mesmo e para tanto, destinaram a Rodoviária do Glicério, uma coisa
horrível para que os ônibus da Empresa EMTRAM pudessem deixar a carga que traziam
dos carentes sertões baianos.
Pois bem, essas pessoas sofriam no pesado durante anos e
anos, não podiam voltar, só os fracassados não ficavam em São Paulo e tinham
que agüentar todo tipo de opressão, até que um dia, não mais agüentando a
saudade dos parentes e da terra, vinham passar uns dias com os seus. Na nossa
cidade não tinha rodoviária, o ponto final do ônibus era em Irecê e aí,
chegando fora de hora e com os dinheiros contados, tinha o nosso chegante, já
amanhecendo o dia, que alugar um carro para trazê-lo até Presidente Dutra e
quando entrava na cidade, ou era visto ainda em Irecê por algum conhecido, este
não se apresentava, vinha correndo na frente até à casa do “paulista” e gritava
MINHAS ALVISTAS, FULANO TÁ NA TERRA e
aí a família tinha que dar um prêmio ao anunciante pela boa e bela notícia,
pois seus corações entravam em festa de tanta alegria pela chegada do ente
querido.
Creio que ALVISTAS seja
uma corruptela de TERRA À VISTA, expressão
muito utilizada pelos marujos, que cansados e doentes da permanência no mar, ao
sentirem que se aproximavam dos continentes gritavam felizes e festejantes: TERRA Á VISTA, TERRA À VISTA e todos se
abraçavam e comemoravam.
Entendo que o mais acertado seria dizer FULANO À VISTA, pois vista com crase significa o que está diante
dos olhos, bem nas suas vistas, bem ali, anunciando a boa nova, a chegada “paulista
presidentinos” que retornava à Dutra após longo período de escravidão em terras
do Sul, como diziam, quando na verdade eram em terras do rico sudeste.
Após receber a notícia a família mandava um emissário
urgente na Praça do Comércio para comprar fogos de artifícios (foguetes),
também cuidava em matar várias galinhas, pois assim que o “sulista” chegasse
seria anunciado festivamente com fogos de artifício e recebido com uma
deliciosa galinha de capoeira, assim como os primeiros vizinhos que chegasse,
também degustaria a saborosa penosa.
Como tudo nesta vida é passageiro, acho que esse costume
todinho nosso não existe mais, mas eu esse tempo era bom, ah, disto não tenho
nenhuma dúvida.
Os “sulistas de São Paulo” traziam gravadores e gravavam
nossas vozes, era impressionante, como um aparelho daqueles repetia igualzinho
nossas vozes, era o comentáros dos mais velhos.
Porém, os gravadores geraram muitas mal querenças, pois
parentes de pessoas que tinham a voz gravada e divulgada para outras pessoas
não gostavam, já que consideravam a iniciativa como um deboche, uma gozação,
uma ironia contra seus parentes e chegaram mesmo a quebrar gravadores dos
nossos paulistas, que após dias de Dutra deixavam de ser novidades e eram
tratados como pessoas comuns. O sucesso era rápido.
Os “paulistas Presidentinos faziam sucesso com as meninas, namoravam
e muitos noivavam e depois voltavam para casar, tenho uma prima de apelido “Gorda”,
que esperou o noivo Fábio de Onésimo durante 13 (treze0 anos, isto mesmo, 13
anos, namoravam por carta e Gorda nunca olhou para outro rapaz e era
extremamente feliz com Fábio, de forma que casaram e vivem até hoje apaixonados.
Os paulistas vinham equipados com reluzentes relógios da cor
de ouro, eram lindos, eu sonhava com um daqueles e dizia, quando eu crescer vou
embora para São Paulo e vou comprar um relógio deste e um óculos também, já que
os “Paulistas Presidentinos” também traziam vistosos óculos Ray ban, tipo
aviador, causando inveja nos pobres presidentinos, que sonhavam com aqueles
luxos fora dos seus alcances, sem contar as radiolas de mão e a pilha, que
faziam a sensação, pois o “Paulista Presidentino” “rico” e muito orgulhoso,
fazia tocar o dia e a noite para os presentes os sucessos de Tonico e Tinoco,
Jacó e Jacozinho, Zilo e Zalo e Teixeirinha e outros, bem como o sucesso
imbatível d Léo Canhoto e Robertinho..
De forma que quem foi a São Paulo naqueles tempos e mesmo
quem não foi, viveu uma doce ilusão, o sonho da riqueza, do luxo e do poder que
nunca viram, mas eram exercitados a troco de muitas mentiras e de muitas bugigangas,
já que tinha “Paulista Presidentino” que dizia que São Paulo era o lugar de
ganhar dinheiro e que estava bem de vida, mas que passados 15 dias de sua
estada na Dutra, tinham que vender o gravador, o relógio e os óculos para poderem
voltar.
MEUS ABRAÇOS DE HOJE:
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