Aos 45 do segundo tempo, o jornalista gaúcho Paulo Sant’Ana perpetrou o artigo mais absurdo de 2014. A única coisa mais sem sentido do que o próprio texto é o fato de ele estar no ar.
Foi no site do Zero Hora. Em “O Céu de Punta”, Sant’Ana elogia o balneário do Uruguai, sensacional por duas razões: não ter uruguaios e, principalmente, não ter pretos.
Escreve ele:
Punta del Este foi erguida pelos argentinos para gozar as delícias da praia, a delicadeza do trânsito e, principalmente, a vantagem enorme de não conviver com os uruguaios. Há gente de todo o mundo em Punta, menos uruguaios. Por isso, os argentinos se refugiaram lá.(…)Mas as ruas e avenidas de Punta são limpíssimas, arejadas por árvores inúmeras e têm um trânsito pacífico e convidativo como não há igual em nenhuma cidade do planeta.(…)Finalmente, é incrível, mas não há sequer um negro em Punta del Este. A 150 quilômetros de Punta, em Montevidéu, há milhares de negros.Mas em Punta nenhum empregado, nenhuma empregada doméstica negra, nem camareiras de hotel.Foi feita em Punta uma segregação racial pacífica e não violenta.Há mais negros na Dinamarca e na Noruega do que em Punta del Este.Ou melhor, não há sequer um só negro ou uma só negra em Punta.
Os erros, a confusão quase superam o racismo rastaquera. Além da invenção de que Punta não tem uruguaios (??), é de se perguntar o que os pobres conterrâneos de Mujica fizeram com o colunista para que ele os odeie tanto.
Quanto aos negros, segundo o autor, graças a Deus por passarem longe dali. Por isso o lugar é paradisíaco. Bendita segregação racial pacífica.
Tido como “torcedor-símbolo” do Grêmio, Sant’Ana é um personagem folclórico na região. Ele foi delegado de polícia, vereador de Porto Alegre pela Arena e apresentador de TV. Em novembro, acabou afastado do rádio depois de um entrever com outro comentarista em que sobre para a mãe de ambos.
O artigo, compreensivelmente, gerou uma gigantesca reação negativa. O autor pediu desculpas meia boca “a quem se sentiu ofendido”. Uma espécie de “foi mal aê”.
Durante a guerra em Gaza, um blogueiro judeu escreveu no Times de Israel advogando que o genocídio seria “permissível” como a única maneira possível de lidar com os palestinos.
Não ficou um dia no ar. O jornal — que é conservador, aliás — removeu a coluna, classificando-a de “inaceitável”. O editor avaliou o texto como “condenável” e “ignorante”, avisando que não iria publicar algo que “incitasse a violência ou atos criminosos”.
Paulo Sant’Ana ainda vai dar muita alegria a seus leitores.
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