Lembro-me
dos ensinamentos de ÉMILE DURKHEIM quando a recordação de Presidente Dutra
enche o meu já velho peito, seus ensinamentos quanto à Sociedade Mecânica se encaixam
como uma luva à sociedade do meu tempo, uma vez que conhecíamos todas as
pessoas da comuna, seus costumes, seus hábitos, era uma sociedade solidária, os
homens e mulheres ainda comiam em gamelas, o café era bem elaborado nas
chaleiras de ferro, as refeições não passavam de feijão e para alguns mais
abastados feijão e arroz, e quando se abatiam criações, a exemplo de bodes e
suínos, pequenas porções eram enviadas para os vizinhos e parentes, era uma
sociedade atrasada, mas não tínhamos homicídios, estupros, assaltos, tráfico de
drogas, o dinheiro? Ah, era somente um detalhe.
A
juventude não conhecia roupas e sapatos de marca, o telefone e a televisão
ainda não haviam dados o ar da graça em nosso querido torrão e o celular era
coisa de ficção, se é que alguém já sonhasse com essas novidades naqueles
tempos. Sim, não havia água encanada e as mulheres transportavam o precioso
líquido em suas cabeças, em latas de querosene de 20 litros, cujos paus
(colocados no meio da lata para melhor se levantar a mesma) eram
caprichosamente colocados por marceneiros da urbe e até fundos de madeira
muitas delas ostentavam, para durarem mais.
Era a
sociedade mecânica do Velho Durkheim, onde homens e mulheres se conheciam, era
a sociedade de Karl Marx, onde todos se reconheciam nos seus próprios
trabalhos, nas suas humildes produções, ainda que artesanalmente.
Mas foi
Marx também quem disse: “tudo que é sólido desmancha no ar” e Durkheim endossou
ao pensar a sociedade orgânica, aquela impessoal, individualista, em que a criação
do dinheiro e da própria cidade transformam o homem em alguém que não precisa
mais comer na gamela e nem necessita de um pedaço da criação abatida, agora ele
pode comprar, não necessita mais conhecer quem produz algo, tudo se desmancha,
as famílias, a religião, as empresas, temos agora uma sociedade líquida, foi
Zygmunt Bauman quem cunhou esse conceito ao escrever a obra “Modernidade
Líquida”, pois, como previu Marx tudo se desmanchou, transformando-se a
sociedade com conceitos e instituições solidificadas em algo líquido,
desmanchado.
Então
indago: qual a sociedade boa? A mecânica, inicial, onde praticamente não
existiam crimes e nem havia a competição desleal, onde o dinheiro era apenas um
detalhe ou a orgânica, onde a impessoalidade é a marca, o egoísmo, o
individualismo desenfreado movido pelo dinheiro e pela cidade que torna o tempo
mais veloz e os espaços mais curtos a cada dia, dando azo a se verberar que
estamos no tempo da velocidade? Respondam, por favor, a do celular, Iphone, a
da internet ou a da gamela?
Mas
Bauman ecoa que tudo se encontra líquido, como a dizer que estamos atrás de um
novo conceito de sociedade, como a dizer que não podemos censurar o que está
acontecendo, já que não existe uma base científica, sociológica e antropológica
para afirmarmos que o certo era no tempo dos nossos pais, pois o que acontece
agora é que pode ser o certo e aí temos outra questão: ficaremos perdidos até
quando em busca de um novo conceito de sociedade? É um grande dilema.
Galego
Aboiador, um dos maiores cantadores nordestinos, nascido aqui bem pertinho em
Itabaiana, em sua música “ORIGEM DO MEU SERTÃO” ele conta que ao passar um
tempo fora se espantou com as mudanças trazidas pelo tempo e que mudaram de
forma radical a sua própria casa, e essa perplexidade do homem daquele tempo
cabe aqui e serve para a Presidente Dutra dos meus tempos e de agora, vejam
trechos da sua música: “Lá não vi o lampião que pai à noite acendia, a lata de
querosene também estava vazia, deram fim ao candeeiro por causa da energia, o
pote de água fria trocaram por geladeira, mas falta aquele gostinho da aguinha
da biqueira, gelada em potes de barro feitos nas mãos da louceiraaaa! Lá não vi
mais a chaleira que mãe fazia café e nem o chifre de boi que pai botava rapé,
coisas que o jovem de hoje se vê não sabe o que é! Lá não vi mais o tropel dos
burros no tabuleiro, nem os estalos dos relhos pros burros andar mais ligeiro,
resta somente a saudade no coração do tropeiro! Meninos da minha terra não
querem brinquedos de osso, coisas que a gente tinha sem gastar nada do bolso.
Da minha vaca de osso não achei nem os retratos e os meninos de hoje não querem
brinquedos baratos, compra um carro da estrela, sacode o outro no mato. No
lugar do oratório que mãe fazia oração, botaram no seu lugar uma grande
televisão....
É isto que resta nos corações dos saudosos, dos
sonhadores, dos exilados da terra que amam em busca da sua estabilidade. Um
abraço ao grande Paulo Novaes, grande figura da minha cidade.
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